O caminho da meditação
Sem dúvida, pode ser dito que, quem cala sua própria voz, passa a escutar a voz de Deus, o Deus que é o Ser Real de todos e está dentro de cada um.
A Divina Voz, ininterruptamente, nos fala a sentença da Verdade que liberta: ‘EU SOU DEUS’. Mas, como A escutar?
Nosso incessante agir, sentir, falar, desejar, rememorar, planejar, anelar, sonhar… em andamento aflito, faz um ruído tão fascinante quanto ensurdecedor.
A inquietude normal que nos engolfa não nos permite salvar-nos por escutar o clamor da voz no deserto, a melodia da flauta de Krishna, a comovente lira de Orfeu, a salvação que vem do Divino Verbo e a lição-ternura e o poder da vibração do Om.
Só escutaremos DEUS dizer-nos EU SOU quando lhe oferecermos a condição precisa, isto é, quando rendermo-nos totalmente a ELE e lhe ofertarmos nossa tranquilidade ou quietude:
‘Rendei-vos e reconhecei que eu sou Deus’.
(Salmos, 46:10, Bíblia de Jerusalém)
‘Aquietai-vos e sabei que eu sou Deus’
(Salmos, 46:10, Sociedade Bíblica do Brasil)
Essa tranquilidade total, que só se alcança com uma incondicional rendição a Deus, é que torna audível o Divino Verbo.
Não foi somente David que nos falou da necessidade de quietude libertadora. Escutemos também Isaías:
‘Se vos retirardes e aquietardes, sereis salvos.
Tranquilidade e segurança serão a vossa força.’
(Isaías, 30:15)
O caminho da meditação
O como alcançar a quietude plena torna-se, assim, um imenso valor para todos que buscam contatar ou unir-se com Deus. A isso se chama salvação, re-ligação e Yoga, e é a meta suprema da vida, direito e desafio nosso.
Os Avatares (encarnações divinas) e os Rishis (sábios videntes) da Índia ensinaram a arte-ciência da meditação, com a qual podemos alcançar a quietude, o vazio e o silêncio da mente.
A parada total das atividades mentais, chamada samadhi, é meta suprema, pois permite a fusão da alma individual do meditante com a Alma Universal, ou Deus, com tudo o que Deus pode e é.
Um objetivo tão alto, evidentemente, não se consegue com facilidade, mas através de um caminho estreito.
Estreito, mas, ao mesmo tempo, venturoso e convidativo para a alma que amadureceu e aprendeu que as delícias e os poderes, a paz e a segurança ‘que o mundo dá’ são falsos e frustradores, por serem inevitavelmente fugazes.
Alcançar a parada da mente é possível, mas somente depois de estabelecido o controle sobre o corpo físico, sobre a bioenergia (prana) e sobre as sensações (pratyahara).
1) ser estável;
2) ser confortável;
3) ser relaxada;
4) e manter a verticalidade da coluna vertebral.
Em condições tais é que se consegue reduzir à plena quietude o corpo físico.
O controle das energias é alcançado através da disciplina respiratória.
Aquietados o corpo e as energias, fácil se torna deixar de sentir [pratyahara] dor, ruídos, frio, calor… Nada se vê, pois os olhos estão fechados. ‘Entra em teu quarto e fecha a porta’…
A intenção do meditador longe está de manter-se pensando, refletindo, lembrando, sonhando, desejando, imaginando…
É parar, esvaziar e silenciar a mente, que, por natureza, é imensamente adversa a qualquer controle, e muito mais contra ser detida.
O meditador aspira somente por encontrar-se com o ‘Pai que está no secreto’. Não deseja ter visões, escutar vozes, ser envolvido em percepções extra-sensoriais, sair do corpo, ‘incorporar’… Apenas aspira a estancar a mente.
Sentado confortável e estavelmente, com a coluna vertical, em relax, com os olhos fechados, o meditador põe-se a contemplar o livre fluir de sua respiração, procurando manter-se, assim, sem outra pretensão que continuar ininterruptamente mirando a entrada e a saída do ar.
E nisso evita a mínima dose de ‘briga’ com a mente, a qual logo se rebela e vai para onde mais deseja, ou melhor, para os objetos do mundo externo que ela sempre deseja.
Qualquer tentativa de submeter a mente, obrigando-lhe a ficar atenta somente sobre o objeto escolhido para a ‘concentração’, é uma forma de lhe dar maior força e segura vitória.
Não há qualquer esperança de, pela força, vencer a mente. Mas ela não é assim tão invencível.
Basta que o meditador não aceite o confronto, que não ouse a impossível tarefa de vencê-la, mas, ao contrário, cultive paciência, gentileza e, digamos, amor. A mente não é para ser combatida, mas seduzida e conquistada.
Para isso, Avatares e Sábios da tradição ensinaram um método milenarmente conhecido como ajapa japa, que consiste em repetir um mantra.
O mantra repetido, no silêncio interior, tem o sortilégio de acalmar e convidar a mente a aprofundar-se em camadas universais cada vez mais sutis, no rumo de se infinitizar na unidade do Ser.
Não é absolutamente indispensável que o mantra seja específico, pessoal. Deus é muito misericordioso e, assim, através dos Mestres, ensinou um mantra universal, isto é, um que serve a todos indiscriminadamente.
Ele é so ham. So vem de Sat, isto é, o Ser, o Deus Supremo. Ham significa ‘eu sou’. So ham é o mesmo que ‘eu e o Pai somos um’. So é o som da nossa inspiração. Ham, o da exalação.
Sentado, em relax, com o corpo inerte, silente, e as sensações cortadas [pratyahara], a meditação entra numa nova fase, a de associar à inspiração a pronúncia mental do so, e, à exalação, ham.
A mente entretida continua com o so ham, no compasso dos movimentos respiratórios, a essa altura muito harmoniosos, livres, sincrônicos e sensivelmente reduzidos.
Não demora muito, o meditador se dá conta de que sua mente já está muito longe, seja no tempo, no espaço, ou em ambos. O que lhe cabe fazer é ter paciência e calma, e, com brandura, trazer de volta a recalcitrante para continuar no so ham, tantas vezes quantas ela fugir.
A meta suprema, a parada total (como que a supressão) da mente e a simultânea união com Deus, é obra para muita persistência e paciência, e pode requerer encarnações e mais encarnações.
A prática diária (vinte minutos pela manhã e à noite), porém, assegura a colheita de preciosos frutos psicossomáticos, evidenciados em controles de laboratórios científicos austeros.
Qualquer que seja a religião de alguém, a meditação lhe é de imenso valor e até mesmo indispensável.
Veja também:
Introdução à meditação
- Texto digitado por Cristiano Bezerra em 5 de outubro de 2001 e também publicado em yoga.pro.br. Visite o site do Instituto Hermógenes em institutohermogenes.com.br [↩]
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