Asana, dor e alinhamento
Pedro Kupfer (1966-), do yoga.pro.br (1)
Há dois tipos de dor que você pode sentir numa prática de asana: uma positiva e outra negativa. A dor positiva é aquela que você sente nos músculos, e que é sinal de que está trabalhando e mexendo nas estruturas físicas, dando a si mesmo um novo corpo. A dor negativa é a que você sente nas juntas, no interior das articulações, e que significa que você está forçando demasiado, fazendo os exercícios sem alinhamento ou praticando sem atenção ou sem a atitude mental correta. Se você tiver um corpo extremadamente flexível, precisa redobrar esses cuidados. Uma opção é trabalhar dentro da margem de segurança, evitando quaisquer exageros (recomendada para pessoas muito flexíveis). A outra, igualmente válida, seria trabalhar no limiar, no ponto onde o prazer se transforma em dor (mais adequada para pessoas não tão flexíveis assim). Nesse último caso, se pede atenção redobrada para evitar acidentes.
Acabamos de mencionar a questão do alinhamento, mas não explicamos nada até agora. O alinhamento é um princípio muito importante dentro da prática, pois ele dá segurança na execução dos asanas. Para um praticante novo, ouvir falar sobre alinhamento pode soar um tanto “etérico”, difícil de entender e mais difícil ainda de colocar em prática. Desde o ponto de vista puramente fisiológico, o alinhamento lida com a postura ideal: ajustar e alinhar corretamente ossos e articulações pode ajudar a prevenir acidentes ou dores no corpo e potencializa o funcionamento da “máquina”, contribuindo desta forma para o bem-estar físico do indivíduo.
Entretanto, limitando-nos ao plano puramente físico, nos confrontamos com diferentes abordagens da questão do alinhamento: deveríamos nos transformar em autômatos iguais aos desenhos dos livros de anatomia ou existiria algum tipo de negociação entre os asanas e o nosso corpo imperfeito, vitimado pelo esquecimento, a má postura ou o descaso? Responderemos essa pergunta logo mais. Não obstante, neste ponto surgem outras questões de índole prática: qual seria o encaixe ideal da pélvis? Devemos colocar o peso do corpo no meio ou à frente das articulações dos tornozelos? Dentre todas as perguntas desse tipo que você possa se formular ao longo de uma prática, o maior desafio é descobrir o que significa alinhamento na sua própria experiência.
Embora o conceito de alinhamento seja uma das coisas mais difíceis de se definir no Yoga, existem diversas abordagens que podem nos ajudar a entende-lo melhor. A primeira aproximação ao conceito de alinhamento envolve a noção dos planos sagital e frontal, que divide o corpo nos hemisférios direito e esquerdo, e partes anterior e posterior. Desde esse ângulo, o alinhamento serviria para consertar as diferenças do corpo entre os lados direito e esquerdo ou anterior e posterior, resolvendo assim casos de desvios de coluna como escoliose, cifose ou lordose. Por exemplo, se ao fazer a inversão sobre os ombros, sarvangasana, surgirem dores nos lados do pescoço ou nos ombros, que é onde se coloca o peso, isso pode significar que está faltando alinhamento vertical.
Entretanto, a consciência dos planos sagital e frontal é apenas o começo. Alinhamento significa igualmente tomar consciência das diferentes maneiras em que as posturas podem vivenciar-se. Significa abrir e criar espaço não apenas ao longo de um eixo, mas no organismo inteiro. Não é unicamente se encaixar ao longo de um eixo; não é algo que se impõe externamente ao corpo: existe sim uma adaptação da postura ao corpo de cada um. Para que você possa começar a tirar alguma conclusão do diálogo interno que surgirá durante a prática, você precisa tornar-se o asana, ser o asana, ao invés de unicamente fazer o asana.
Desenvolver a intuição de como o alinhamento trabalha pode despertar experiências escondidas no corpo, tornando conscientes os samskaras, os condicionamentos que moldam as nossas estruturas musculares. Nesse plano, ainda mais sutil, o alinhamento funciona para abrir caminhos para que a energia ascenda.
Dessa forma, buscar o alinhamento profundo pode comparar-se à tarefa de lapidar um diamante. Em primeiro lugar, precisamos colocar muita atenção no processo e ter claro aquilo que estamos procurando. Partindo de uma pedra bruta, o lapidador consegue enxergar as linhas onde a pedra se abrirá de maneira que se revele a beleza da sua forma e usar essas linhas a seu favor. Uma vez identificadas as linhas de corte, há ainda muito trabalho pela frente, polindo e eliminando as asperezas da superfície da pedra.
A prática de asana é como lapidar o diamante que nós mesmos somos: só podemos chegar lá sozinhos. Obviamente, um professor competente poderá ajudar, nos mostrando o caminho através de instruções ou sugestões, mas estamos falando de algo sutil, subjetivo e pessoal. Você só conseguirá entender na hora em que estiver fazendo a prática.
» por Há dois tipos de dor que você pode sentir numa prática de asana: uma positiva e outra negativa. A dor positiva é aquela que você sente nos músculos, e que é sinal de que está trabalhando e mexendo nas estruturas físicas, dando a si mesmo um novo corpo. A dor negativa é a que você sente nas juntas, no interior das articulações, e que significa que você está forçando demasiado, fazendo os exercícios sem alinhamento ou praticando sem atenção ou sem a atitude mental correta. Se você tiver um corpo extremadamente flexível, precisa redobrar esses cuidados. Uma opção é trabalhar dentro da margem de segurança, evitando quaisquer exageros (recomendada para pessoas muito flexíveis). A outra, igualmente válida, seria trabalhar no limiar, no ponto onde o prazer se transforma em dor (mais adequada para pessoas não tão flexíveis assim). Nesse último caso, se pede atenção redobrada para evitar acidentes.
Acabamos de mencionar a questão do alinhamento, mas não explicamos nada até agora. O alinhamento é um princípio muito importante dentro da prática, pois ele dá segurança na execução dos asanas. Para um praticante novo, ouvir falar sobre alinhamento pode soar um tanto “etérico”, difícil de entender e mais difícil ainda de colocar em prática. Desde o ponto de vista puramente fisiológico, o alinhamento lida com a postura ideal: ajustar e alinhar corretamente ossos e articulações pode ajudar a prevenir acidentes ou dores no corpo e potencializa o funcionamento da “máquina”, contribuindo desta forma para o bem-estar físico do indivíduo.
Entretanto, limitando-nos ao plano puramente físico, nos confrontamos com diferentes abordagens da questão do alinhamento: deveríamos nos transformar em autômatos iguais aos desenhos dos livros de anatomia ou existiria algum tipo de negociação entre os asanas e o nosso corpo imperfeito, vitimado pelo esquecimento, a má postura ou o descaso? Responderemos essa pergunta logo mais. Não obstante, neste ponto surgem outras questões de índole prática: qual seria o encaixe ideal da pélvis? Devemos colocar o peso do corpo no meio ou à frente das articulações dos tornozelos? Dentre todas as perguntas desse tipo que você possa se formular ao longo de uma prática, o maior desafio é descobrir o que significa alinhamento na sua própria experiência.
Embora o conceito de alinhamento seja uma das coisas mais difíceis de se definir no Yoga, existem diversas abordagens que podem nos ajudar a entende-lo melhor. A primeira aproximação ao conceito de alinhamento envolve a noção dos planos sagital e frontal, que divide o corpo nos hemisférios direito e esquerdo, e partes anterior e posterior. Desde esse ângulo, o alinhamento serviria para consertar as diferenças do corpo entre os lados direito e esquerdo ou anterior e posterior, resolvendo assim casos de desvios de coluna como escoliose, cifose ou lordose. Por exemplo, se ao fazer a inversão sobre os ombros, sarvangasana, surgirem dores nos lados do pescoço ou nos ombros, que é onde se coloca o peso, isso pode significar que está faltando alinhamento vertical.
Entretanto, a consciência dos planos sagital e frontal é apenas o começo. Alinhamento significa igualmente tomar consciência das diferentes maneiras em que as posturas podem vivenciar-se. Significa abrir e criar espaço não apenas ao longo de um eixo, mas no organismo inteiro. Não é unicamente se encaixar ao longo de um eixo; não é algo que se impõe externamente ao corpo: existe sim uma adaptação da postura ao corpo de cada um. Para que você possa começar a tirar alguma conclusão do diálogo interno que surgirá durante a prática, você precisa tornar-se o asana, ser o asana, ao invés de unicamente fazer o asana.
Desenvolver a intuição de como o alinhamento trabalha pode despertar experiências escondidas no corpo, tornando conscientes os samskaras, os condicionamentos que moldam as nossas estruturas musculares. Nesse plano, ainda mais sutil, o alinhamento funciona para abrir caminhos para que a energia ascenda.
Dessa forma, buscar o alinhamento profundo pode comparar-se à tarefa de lapidar um diamante. Em primeiro lugar, precisamos colocar muita atenção no processo e ter claro aquilo que estamos procurando. Partindo de uma pedra bruta, o lapidador consegue enxergar as linhas onde a pedra se abrirá de maneira que se revele a beleza da sua forma e usar essas linhas a seu favor. Uma vez identificadas as linhas de corte, há ainda muito trabalho pela frente, polindo e eliminando as asperezas da superfície da pedra.
A prática de asana é como lapidar o diamante que nós mesmos somos: só podemos chegar lá sozinhos. Obviamente, um professor competente poderá ajudar, nos mostrando o caminho através de instruções ou sugestões, mas estamos falando de algo sutil, subjetivo e pessoal. Você só conseguirá entender na hora em que estiver fazendo a prática.
- Texto extraído das páginas 76 e 77 da 3ª edição, de fevereiro de 2001, do livro Yoga Prático (1998), de Pedro Kupfer (1966-), e também publicado em 27 de janeiro de 2001 em yoga.pro.br, o site do Pedro [↩]
Achei muito interessante e gostaria da continuar recebendo sempre as novidades desse Blog. Gostaria de receber informações acerca dos Vedas e artigos publicados aqui neste Blog, sem ter que comprar mais livros sobre o Hatha Yoga, o qual pratico há 20 anos. Muito grata. Hari Om!
Olá, Ana Maria! Muitíssimo grato pela tua visita e por esse teu comentário aqui. E não há de quê, a gratidão é toda nossa! Hari Om!