Aos Professores
Tales Nunes, do Vida de Yoga (1)
Em conversa com o meu professor e amigo, ele contava como é a vida no Ashram que visita na Índia. Ashram pode ser traduzido como “retiro”. Quando se está no Ashram, você é membro de uma família, a família do guru, ou gurukulam. Todos estão ali reunidos, tendo aulas de sânscrito, de Vedanta, apoiado nas escrituras sagradas hindus, para aprender sobre o Ser. A busca final é o conhecimento do Ser.
Pensando e conversando sobre essa experiência, comecei a refletir sobre a cultura que vivemos. Em que âmbito da nossa cultura podemos ter semelhante experiência e buscar tal conhecimento? As escolas estão longe de nos fornecerem conhecimento sobre nós mesmos. Raros são os professores que nos ensinam coisas perenes. No seio da família, com raras exceções, não temos o privilégio de recebermos esse tipo de instrução. A Igreja, enquanto instituição política e econômica, embora cumpra papel importante, enquanto formadora de seres humanos, ensinando ética e valores que nos ajudem a viver uma vida com mais união e respeito, está falida. Restou-nos a Universidade. A Universidade, também por questões políticas e econômicas, encontra-se fragmentada e cumpre o papel de formar profissionais competentes e não seres humanos.
Mas o nome academia – do qual chamamos muitas vezes as Universidades – deriva do latim academia. Este, por sua vez, veio do grego akademeia, que se referia à Academia criada por Platão na Grécia antiga. A Academia de Platão ficava nos arredores de Atenas. Lá era possível ter instruções em matemática, dialética, ciências naturais. Essa instrução filosófica adquirida na Academia tinha o objetivo não de ensinar, mas de relembrar. E essa é uma visão muito linda que foi perdida pela maioria das tradições ocidentais.
É importante lembrar que os gregos acreditavam na imortalidade da alma e na reencarnação. Uma das provas da reencarnação, para Platão, era o fato de que toda a nossa instrução não passa de reminiscência. Ou seja, tudo o que lembramos no presente, sem dúvida, foi aprendido há algum tempo atrás. Portanto, o objetivo da Academia era de fazer as pessoas lembrarem de um conhecimento que já possuíam. Esse conhecimento jaz guardado no espírito, pois a causa de tudo o que existe é ele próprio.
Pensando dessa maneira, nós já possuímos todo o conhecimento de que precisamos. Todos nós possuímos sabedoria. A ignorância deixa de ser a falta de conhecimento, e passa a ser o esquecimento. E é aí que entra o papel da Academia, do Ashram, ou de qualquer instituição semelhante que nos ajude a lembrarmo-nos quem realmente somos, para que viemos e para onde vamos. Dentro dessa família, gurukulam, existe um pai, que é a pessoa que a todo instante ajuda-nos a nos lembrar. Ele, por sua vez, teve um guru, que ajudou-o a lembrar…
Assim, nesse processo, o conhecimento é eterno e nós, enquanto seres encarnados, temos o papel, na vida, dentro de um tempo limitado, de lembrarmo-nos quem somos. Há experiências, situações e pessoas que nos ajudam a lembrar quem somos. O processo se dá entre imersões e emersões. O diálogo externo com o guru, com um amigo ou professor, leva-nos para dentro e alimenta a meditação e reflexão interior. Disso nasce a realização, ou seja, a lembrança.
Voltando aos gregos, Platão acreditava que o conhecimento essencial nasce da dialética. Esta é um debate, uma discussão ou um diálogo entre opiniões contrárias e contraditórias para que o pensamento e a linguagem passem da contradição entre as aparências à identidade de uma essência. Lembremos que, da mesma maneira, os textos sagrados indianos, como a Bhagavad Gita e muitas Upanishads, estão escritas em forma de diálogo. Diálogo nascido de um conflito existencial. E é a partir do diálogo que nasce a lembrança, a realização, o conhecimento. Todos nós possuímos esse conflito, mas também possuímos o conhecimento.
Cabe a nós procurarmos os nossos guias externos, que nos ajudem a levar-nos para dentro. Que nos ajudem a lembrarmo-nos quem realmente somos. E, ao mesmo tempo, como professores, amigos e instrutores, ajudemos os outros a lembrarem-se do que realmente importa na vida, o conhecimento do Ser.
Pessoalmente, agradeço aos meus professores, amigos e irmãos dentro da família do Yoga, e fora dela, que me ajudam constantemente no meu processo de aprendizado, ou melhor, de lembrança. Agradeço também a todos aqueles que deixaram algum tipo de conhecimento registrado – em forma de música, poesia, prosa, diálogo – que chegou às minhas mãos e que me levaram à reflexão. A todos esses, a minha reverência!
» por Em conversa com o meu professor e amigo, ele contava como é a vida no Ashram que visita na Índia. Ashram pode ser traduzido como “retiro”. Quando se está no Ashram, você é membro de uma família, a família do guru, ou gurukulam. Todos estão ali reunidos, tendo aulas de sânscrito, de Vedanta, apoiado nas escrituras sagradas hindus, para aprender sobre o Ser. A busca final é o conhecimento do Ser.
Pensando e conversando sobre essa experiência, comecei a refletir sobre a cultura que vivemos. Em que âmbito da nossa cultura podemos ter semelhante experiência e buscar tal conhecimento? As escolas estão longe de nos fornecerem conhecimento sobre nós mesmos. Raros são os professores que nos ensinam coisas perenes. No seio da família, com raras exceções, não temos o privilégio de recebermos esse tipo de instrução. A Igreja, enquanto instituição política e econômica, embora cumpra papel importante, enquanto formadora de seres humanos, ensinando ética e valores que nos ajudem a viver uma vida com mais união e respeito, está falida. Restou-nos a Universidade. A Universidade, também por questões políticas e econômicas, encontra-se fragmentada e cumpre o papel de formar profissionais competentes e não seres humanos.
Mas o nome academia – do qual chamamos muitas vezes as Universidades – deriva do latim academia. Este, por sua vez, veio do grego akademeia, que se referia à Academia criada por Platão na Grécia antiga. A Academia de Platão ficava nos arredores de Atenas. Lá era possível ter instruções em matemática, dialética, ciências naturais. Essa instrução filosófica adquirida na Academia tinha o objetivo não de ensinar, mas de relembrar. E essa é uma visão muito linda que foi perdida pela maioria das tradições ocidentais.
É importante lembrar que os gregos acreditavam na imortalidade da alma e na reencarnação. Uma das provas da reencarnação, para Platão, era o fato de que toda a nossa instrução não passa de reminiscência. Ou seja, tudo o que lembramos no presente, sem dúvida, foi aprendido há algum tempo atrás. Portanto, o objetivo da Academia era de fazer as pessoas lembrarem de um conhecimento que já possuíam. Esse conhecimento jaz guardado no espírito, pois a causa de tudo o que existe é ele próprio.
Pensando dessa maneira, nós já possuímos todo o conhecimento de que precisamos. Todos nós possuímos sabedoria. A ignorância deixa de ser a falta de conhecimento, e passa a ser o esquecimento. E é aí que entra o papel da Academia, do Ashram, ou de qualquer instituição semelhante que nos ajude a lembrarmo-nos quem realmente somos, para que viemos e para onde vamos. Dentro dessa família, gurukulam, existe um pai, que é a pessoa que a todo instante ajuda-nos a nos lembrar. Ele, por sua vez, teve um guru, que ajudou-o a lembrar…
Assim, nesse processo, o conhecimento é eterno e nós, enquanto seres encarnados, temos o papel, na vida, dentro de um tempo limitado, de lembrarmo-nos quem somos. Há experiências, situações e pessoas que nos ajudam a lembrar quem somos. O processo se dá entre imersões e emersões. O diálogo externo com o guru, com um amigo ou professor, leva-nos para dentro e alimenta a meditação e reflexão interior. Disso nasce a realização, ou seja, a lembrança.
Voltando aos gregos, Platão acreditava que o conhecimento essencial nasce da dialética. Esta é um debate, uma discussão ou um diálogo entre opiniões contrárias e contraditórias para que o pensamento e a linguagem passem da contradição entre as aparências à identidade de uma essência. Lembremos que, da mesma maneira, os textos sagrados indianos, como a Bhagavad Gita e muitas Upanishads, estão escritas em forma de diálogo. Diálogo nascido de um conflito existencial. E é a partir do diálogo que nasce a lembrança, a realização, o conhecimento. Todos nós possuímos esse conflito, mas também possuímos o conhecimento.
Cabe a nós procurarmos os nossos guias externos, que nos ajudem a levar-nos para dentro. Que nos ajudem a lembrarmo-nos quem realmente somos. E, ao mesmo tempo, como professores, amigos e instrutores, ajudemos os outros a lembrarem-se do que realmente importa na vida, o conhecimento do Ser.
Pessoalmente, agradeço aos meus professores, amigos e irmãos dentro da família do Yoga, e fora dela, que me ajudam constantemente no meu processo de aprendizado, ou melhor, de lembrança. Agradeço também a todos aqueles que deixaram algum tipo de conhecimento registrado – em forma de música, poesia, prosa, diálogo – que chegou às minhas mãos e que me levaram à reflexão. A todos esses, a minha reverência!
- Artigo originalmente publicado em 10 de outubro de 2007 em yoga.pro.br e também publicado em 19 de agosto de 2009 em vidadeyoga.com.br, o site do Tales. [↩]
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